English version

Camilo Castelo Branco

Poemas


SALVE, REI! 

II

Sobre o solo dos Afonsos Ferro ceptro esmaga a lei: Ruge ali o despotismo se não, verga ao servilismo quem lhe diz «Tu não és Rei!» Não és Rei! És uma afronta feita ao povo português! Não és Rei que não herdaste este chão que escravizaste a quem falso Rei te fez!
Vaga o anjo do extermínio como inspiração do algoz! Corações com vossa imagem. Oh meu Rei! São a carnagem do punhal que fere atroz! Foram dias de martírio, de terror e maldição! Mas o mártir, expirando, esquecia-vos só quando lhe morria o coração!
Vaga o anjo do extermínio do mosteiro sobre a cruz, e roçando a negra asa pela cruz o templo arrasa e do altar extingue a luz. Cospe, injurias e sarcasmo sobre a face do ancião, porque orava, é réu, e expulso foge á morte, e cede ao impulso de penúria, e pede pão. Pede o pão que amassa em pranto de saudades que crê vem duma cela que comprara, quando o mundo cá deixara com as pompas que ele tem! Pede o pão que lhe usurparam com tamanho desamor... Fraco, ao ver que chega a morte, Morre... e então mostra que é forte perdoando ao matador! 
Lá, no campo da carnagem, mutilado um corpo jaz... Ficaram-lhe ali seus ossos...Pois que foi um dentre os vossos Real Senhor! Não terá paz. Nem a paz dos que morreram sem a nódoa da traição nem a paz da sepultura ao fiel que honrado jura morrer sob o seu pendão.
Lá se abraça ao corpo exangue no abandono da viuvez a que ali vive arrastada mendigando, envergonhada, Impropérios... talvez! Pobre, e só, mãe de três filhos quando a fome a constrangeu, ainda assim, um pensamento, uma esperança, um grato alento foi por Vós que o concebeu...
Vaga o anjo do extermínio, enverga o manto real; Dum diadema a fronte cinge, mas o sangue que lho tinge brada vingança fatal! Nessa fronte ensanguentada escreveu a mão de Deus!... Mas também homens puseram Inscrições onde se leram Infâmias como troféus!



Outros Livros



Desenvolvido por Bizview - Sistemas e Comunicação